quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Divã no Deserto.

Por Jordan Campos

 

Ele caminhava suando frio pelo deserto da alma.
Seu suor se confundia com lágrimas de cansaço e pedidos de trégua em vão
Que os dedos de suas mãos eram poucos para contar.
Um cowboy atípico sem “ bala na agulha” ou cartaz de procurado.
Caminhava esquecido pelo deserto.
Vultos estranhos tentavam confundi-lo,
Vozes ectoplasmáticas materializavam que desistisse.
Havia sangue nos olhos dele.
Não de raiva ou amargura, mas já não tinha coração e os seus olhos abrigavam e pulsavam sangue por falta de opção.
Sem água, sem carinho, sem uma sombra, sem um maldito inseto para conversar e desabafar.
Sua cabeça pesava, mas algo além do corpo, não desistia, era frágil e forte ao mesmo tempo.
Um inverno cármico em pleno deserto.

Não questionava Deus, não queria metê-lo naquela situação.
Ainda tinha a vida e não blasfemaria contra Ele.
No chão um escrito estranho dizia:
“Portanto, cingindo os lombos do vosso entendimento sede sóbrios e esperai..."
Sorriu, se hidratando de lágrimas e suor... Entendeu e desconfiou. Aceitou.
Já não sabia se estava no meio do caminho, ou chegando... Ou apenas começado.
Tinha que seguir, sem bússola, conselho ou placa de trânsito num cacto que nem existia.
De repente uma caixa branca aparecia na sua frente.
Tôsca e rude, talhada às pressas da sede de quem a fez.
Por instinto pegou.
Uma sombra apareceu e se fez notar.
Seus olhos doíam e arranhavam ardentes, misturados com grãos de areia e lágrimas.
Suas mãos cansadas demais para limpá-los.
Arqueou as sobrancelhas e apenas entendia que ali se fazia algo definitivo.
Por instinto abriu a caixa e uma nuvem branca cintilante saiu da mesma
Como em filmes animados, a luz devorou a sombra e sentiu uma vertigem e um prazer ao mesmo tempo.

Dois dias depois, em um oásis, um homem sentado mexia nas águas...
Como se a esperá-lo, fez honra com a cabeça.
Ele perguntou se ele era o dono do lugar
Ao que foi dito que apenas o guardava...
Perguntou então se ele esperava algo.
- Sim.
- A caixa?
- Por certo, já é chegada a hora de levá-la. Você está pronto?
- Para quê?
- Para ser responsável em poder ir sem peso algum, agora. Livre da caixa das sombras.
- Não entendo...
- Foi preciso o que chamam de mal para mostra-lhe a urgência do bem.
- Sim, matei o diabo na última curva.
- Não. Você matou teu ego e teu orgulho e trocou por começar de novo.
- Mas... E as pessoas?
- Culpa ainda?
- Um pou...
- Cale-se. Lembre de sua história toda, de cada momento limite e que pela lógica pura dos homens jamais chegaria aqui. Sem culpa. A necessidade chama a prova, o “pior” é apenas mais uma lição.
- Chega?
- Chega! Deixe-me levar a caixa.
- Agradeço... E por onde se sai daqui?
- Durma, e ao acordar não estará mais aqui... Durma nas águas.
- Tudo vai ficar bem?
- Tudo sempre esteve bem, não existem linhas tortas, apenas ignorância e necessidade de podas.
- Obrigado.
- Não agradeça. Vá e não peques mais, ame o amor e comece com créditos.
- Adeus.
- A Deus.

( ... )

Um comentário:

  1. Mais uma receita de sucesso: andar no deserto em meio a condições adversas e inóspitas e, ainda assim, seguir em frente. Não desistir pois sempre há um oasis. E um amor à nossa espera.

    R. Castiglioni

    ResponderExcluir